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Recentemente ouvi da minha mãe: “o mundo não é do jeito que você pensa”. De alguma forma ela está certa, realmente, o mundo é muito maior do que consigo medir com uma única existência, ver com os meus olhos abertos e ouvir só com os meus ouvidos. Ser uma travesti branca, nascida e imersa imediatamente em doutrinas cristãs me coloca em uma fronteira entre linhas abissais e me faz uma lacuna em um jogo cruel de ser ou não lida como humana, como num jogo de arrancar pétalas de uma flor cantando “bem me quer” ou “mal me quer” intercaladamente a cada gesto violento, de deslegitimação, de invisibilidades absolutas ou de morte midiática. Sobre medir a existência, aprendo com Vita da Silva que os limites de ser travesti é o não limite ou, nas palavras dela, “um acordo com os nossos próprios limites”, um conjunto de acontecimentos, arranjos e autoelaborações que contribuem para a produção de nossa experiência travesti. Essa elaboração é complexa e se constitui como uma tecnologia de reconhecimento dos espaços que atravessamos cotidianamente, de obter sabedoria sobre si mesmo e sobre como ser no presente algo que ainda está em nosso imaginário, de se gestar dentro de um ventre aberto, exposto á violências, de nascer tantas vezes e morrer tantas outras. Ser muitas em um único mundo. Essa amostragem é uma caixa de memórias aberta, construída pela própria artista sobre si mesma e sobre o que ela ensaia de sua origem, sua geração, sua criação, sua transformação e depois a transmutação, a morte, a vivência no CIStema-mundo moderno e o seu (re)nascimento. Uma travesti que pinta a vida sobre saber e viver fora dos domínios governados pela Razão Universal, por Cisheteroterrorismos e  por tecnologias globais de desumanização. Ao atravessar essa exposição você descobre que não há apenas uma única versão dessa sujeita, que ela detém os controles dos mistérios sobre si, mas que ela não vai te dizer nem te ensinar como fazer isso. Aqui não contém promessas e garantias quanto a reproduzir tal experiência como uma receita exequível, pois o conjunto desta amostragem é uma cartografia sobre si mesma, é um reflexo que remonta a experiência de imagens que outrora fora colonizada e temia a si mesma, é também a decomposição dessas imagens viciadas e introjetadas nos imaginários populares que contam sobre uma história única. Vita da Silva é faca afiada para cortar as articulações da colonialidade moderna e as consciências autodeterminadas dos sujeitos, ela movimenta a realidade dos edifícios do pensamento comum e está determinada em contar as histórias que a maioria, eu diria, não estão dispostas a ouvir.   

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Texto Curatorial

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Judá           Nunes

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